Nos crimes econômicos, o direito penal tem sido utilizado como instrumento intimidador na tentativa de diminuir os casos de corrupção no país, principalmente pela possibilidade de alterar o status libertatis do indivíduo que tenha cometido possíveis infrações penais.
No entanto, quando se estudam crimes econômicos, o único interesse do Estado é a arrecadação dos impostos que deixaram de ser recolhidos aos cofres públicos. Prova disso é a opção de adesão de parcelamento do débito fiscal até o recebimento da denúncia criminal, situação que obrigatoriamente prevê a suspensão da ação penal e a possibilidade de extinção de punibilidade da responsabilidade criminal, caso ocorra o pagamento integral do débito.
Nos caso de eventual crime contra a ordem tributária, o agente se vê envolvido em dois procedimentos judiciais ao mesmo tempo, pois, além da investigação criminal que será presidida pelo Delegado de Polícia, de outro lado se encontra a Procuradoria da União, do Estado ou do Município realizando a cobrança do débito fiscal, razão pela qual a parte investigada poderá utilizar-se dos resultados obtidos nas demandas movidas contra a Fazenda Pública, como na ação anulatória e nos embargos à execução fiscal. Senão, vejamos.
Jurisprudência favorável
Em julgamento recente pela 5ª Turma do TRF3ª, o Desembargador Ali Mazloum, ao examinar o habeas corpus n.º 5006970-03.2023.4.03.0000, acolheu os argumentos da defesa e concedeu a liminar para suspender a ação penal contra dois empresários acusados de suposto crime de sonegação fiscal, considerando que o débito fiscal estava completamente garantido na esfera cível pelos investigados. Note-se:
“(…) Como se observa, o impetrante demonstra que houve oferecimento de imóvel à penhora na ação de execução fiscal, a fim de endossar o futuro pagamento do crédito tributário. Contudo, apesar de a penhora de bens imóveis ser meio idôneo para caucionar o juízo na execução fiscal – consoante disposto no artigo 9º, inciso III, da Lei nº 6.830/80 –, é sabido que não tem por efeito suspender a exigibilidade do crédito garantido, uma vez que não está elencado no rol taxativo do artigo 151 do CTN… omissis… Assim, ainda que o paciente tenha acautelado o débito tributário por meio de oferecimento de bem imóvel à penhora em sede de execução fiscal, isso não equivale ao depósito do montante integral do tributo para fins do artigo 151, inciso II, do CTN, já que o C. STJ consolidou o entendimento de que o art. 151 do CTN é taxativo ao elencar as hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito, não contemplando o oferecimento de bens imóveis à penhora em seu rol. Assim, não há que se falar em suspensão da exigibilidade do crédito tributário definitivamente constituído e sobre o qual se fundamenta a denúncia nos autos da ação penal n. 5013279-97.2019.4.03.6105. Inviável, pois, a incidência, por analogia, do artigo 9º da Lei nº 10.684/2003 para julgar suspensa a pretensão punitiva estatal. É certo, pois, que não foi adimplido o crédito tributário da denúncia, já que a garantia aceita na ação executiva não possui a natureza jurídica de pagamento da exação, não havendo que se falar em suspensão da exigibilidade do crédito. Contudo, a alegada prejudicialidade, pelo menos neste juízo perfunctório, pode ser vislumbrada pelos elementos trazidos pelo impetrante e de acordo com a jurisprudência mais moderna. Verifica-se que foi prestada garantia integral do crédito tributário por penhora de bem imóvel, inclusive, avaliado em valor superior à dívida, estando atendido o requisito referente à garantia da integralidade do crédito tributário, de modo que, uma vez oferecidas e aceitas pelo Juízo da Execução Fiscal garantias integrais sobre os valores devidos, não se justificaria a tramitação do processo criminal, pois a solução adotada nos autos da execução fiscal pode vir a ensejar a extinção da punibilidade do crime correlato ao crédito tributário (já garantido em juízo), pelo pagamento integral do débito fiscal, ou mesmo proporcionar a absolvição do réu/paciente por ausência de materialidade apurada na perícia em curso, pela eventual desconstituição do crédito tributário. Julgados do eg. STJ também acenam para a possibilidade da suspensão da ação penal, considerando prejudicial a questão discutida no processo cível... omissis… Anoto que a questão aventada neste HC refere-se à materialidade delitiva, de modo que repercute na esfera do corréu. Logo, a ação deve ser suspensa em relação a ambos os acusados. Comunique-se¸ com urgência, o teor desta decisão ao Juízo de origem para cumprimento, bem como para que preste as devidas informações…” (grifamos)
Conforme demonstrado acima, o julgador não desconhece o rol taxativo do artigo 151 do Código Tributário Nacional, que prevê apenas o depósito em dinheiro para a suspensão do crédito tributário, mas demonstra que a garantia integral da dívida certamente repercutirá na extinção de punibilidade do acusado, seja pela desconstituição do crédito tributário com o acolhimento da tese apresentada em matéria de defesa, seja pelo pagamento integral do débito em razão da garantia apresentada pelos investigados.
Considerando que nos crimes contra a ordem tributária o único interesse do Estado é a arrecadação dos impostos aos cofres públicos, permitir que se prossiga com a persecução criminal contra o agente que tenha demonstrado sua boa-fé, garantindo o Juízo, mostra-se temerário e assombroso, até porque, no processo penal, com a possibilidade de ocorrerem oitivas de testemunhas, alegações finais e sentença no mesmo ato, qualquer condenação será arbitrária e estará predestinada a ser revogada, pois o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal é de que a extinção de punibilidade do réu pode ser declarada a qualquer momento, inclusive após eventual condenação, bastando o pagamento integral do débito.
Equipe AFA
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